A queda de Jerusalém em 586 a.C. representa um dos momentos mais decisivos e traumáticos da história do povo judeu. Este evento catastrófico não apenas encerrou a independência política do reino de Judá, mas também marcou o início do período conhecido como Exílio Babilônico. A destruição do Templo de Salomão, símbolo máximo da identidade religiosa judaica, e a deportação de grande parte da população para a Babilônia transformaram profundamente a religião e a cultura do povo hebreu.
Este artigo examina em profundidade os eventos que levaram à queda de Jerusalém, com foco especial no período entre os reinados de Josias e Zedequias. Analisaremos o contexto geopolítico da época, marcado pela disputa entre as grandes potências do Egito, Assíria e Babilônia pelo controle da região, e como os pequenos reinos da Palestina, incluindo Judá, se encontraram pressionados neste cenário de transformações políticas e militares.(Veja a saga de famílias que sobreviveram a esse período sombrio na vida dos hebreus)
O Contexto Histórico: O Oriente Médio no Século VII a.C.
O Declínio Assírio e a Ascensão da Babilônia
Durante a maior parte do século VII a.C., o Império Assírio dominou o Oriente Médio com uma política de terror e subjugação dos povos conquistados. No entanto, após a morte do rei Assurbanipal em 627 a.C., o império entrou em rápido declínio, enfraquecido por disputas dinásticas internas e revoltas nas províncias.
Nabopolassar, governador da Babilônia, aproveitou essa oportunidade para declarar a independência babilônica em 626 a.C. Aliando-se aos medos (outro povo que também buscava libertação do jugo assírio), os babilônios iniciaram uma série de campanhas militares contra as principais cidades assírias. Em 612 a.C., a capital assíria, Nínive, caiu perante o exército babilônico-medo após um cerco de três meses.
Em 605 a.C., na Batalha de Carquemis, as forças babilônicas sob o comando de Nabucodonosor II (filho de Nabopolassar) derrotaram decisivamente o exército egípcio, que tentava apoiar os últimos remanescentes do império assírio. Esta vitória consolidou o poder babilônico sobre toda a região da Síria-Palestina, incluindo o reino de Judá.
A Geopolítica da Palestina
Geograficamente, o reino de Judá ocupava uma posição estratégica no corredor sírio-palestino, zona de passagem obrigatória entre as potências do norte (Assíria e Babilônia) e o Egito ao sul. Esta localização tornava Judá um Estado-tampão natural e um território de grande importância estratégica. Economicamente, a região era valorizada pelo controle das rotas comerciais que ligavam o Mediterrâneo às terras da Mesopotâmia e à Península Arábica.
O pequeno reino judaico enfrentava, assim, o dilema constante de ter que escolher entre aliar-se ao Egito ou submeter-se às potências mesopotâmicas. Esta posição delicada exigia habilidade diplomática e sabedoria política dos reis de Judá, que frequentemente se encontravam pressionados a tomar decisões difíceis em um cenário internacional instável e ameaçador.
O Reinado de Josias (640-609 a.C.): A Última Esperança de Independência
Ascensão e Reformas Religiosas
Josias subiu ao trono de Judá com apenas oito anos de idade, em 640 a.C., após o assassinato de seu pai, o rei Amon. Durante sua minoridade, o reino foi provavelmente administrado por um conselho de regência. Quando assumiu efetivamente o poder, por volta de 628 a.C., o jovem rei iniciou um ambicioso programa de reformas religiosas.
O momento era propício: o Império Assírio, que havia dominado Judá durante o reinado de Manassés (avô de Josias), encontrava-se em franco declínio após a morte de Assurbanipal. A debilidade assíria permitiu que Josias implementasse suas reformas sem interferência externa.
Em 622 a.C., durante trabalhos de restauração no Templo de Jerusalém, foi descoberto um “Livro da Lei” (provavelmente uma versão primitiva do Deuteronômio). Este achado inspirou Josias a intensificar suas reformas:
- Centralização do culto em Jerusalém e destruição dos santuários provinciais
- Purificação do culto com a eliminação de práticas e símbolos considerados idólatras
- Restauração da observância da Páscoa e outras festividades religiosas antigas
- Reafirmação da aliança entre Yahweh e o povo de Israel
Os estudiosos consideram as reformas de Josias um momento crucial na história religiosa judaica, quando elementos fundamentais que caracterizariam o judaísmo posterior foram consolidados.
Expansão Territorial e Política Externa
Aproveitando o vácuo de poder criado pelo declínio assírio, Josias expandiu sua influência para o norte, em territórios que haviam pertencido ao antigo Reino de Israel (destruído pelos assírios em 722 a.C.). Escavações arqueológicas em Megido e outros sítios do norte confirmam a presença judaica nessas regiões durante seu reinado.
A política externa de Josias parece ter sido cautelosa, evitando alianças formais tanto com o Egito quanto com a emergente Babilônia. Esta neutralidade permitiu-lhe manter relativa autonomia e implementar seu programa de renovação religiosa e política sem interferências externas.
Morte Prematura em Megido
O promissor reinado de Josias terminou abruptamente em 609 a.C. Quando o faraó Neco II marchava para o norte com seu exército para auxiliar os remanescentes assírios contra os babilônios, Josias interceptou-o em Megido. As motivações exatas do rei judaico permanecem objeto de debate entre os historiadores:
- Alguns sugerem que ele tentava manter sua independência recém-conquistada
- Outros propõem que ele já havia estabelecido algum tipo de aliança com a Babilônia
- Há quem argumente que sua ação foi motivada por considerações teológicas, vendo na queda da Assíria a realização de profecias divinas
Independentemente de suas motivações, Josias foi mortalmente ferido na batalha. Seu corpo foi transportado de volta a Jerusalém, onde foi sepultado com grandes honras. Sua morte prematura aos 39 anos é relatada como tendo causado profundo luto em todo o reino.
As esperanças de independência e renovação nacional que Josias havia inspirado foram sepultadas com ele. Os reis subsequentes de Judá seriam meros peões no jogo das grandes potências, e o reino entraria em rápido declínio até sua completa destruição em 586 a.C.
Joacaz (609 a.C.): Um Reinado Efêmero
Ascensão Conturbada
Após a morte de Josias em Megido, o “povo da terra” (possivelmente uma assembleia de notáveis) escolheu como sucessor não o primogênito Eliaquim, mas sim Joacaz (também chamado Salum), filho mais jovem do rei falecido. Esta escolha sugere que Joacaz era visto como mais propenso a continuar a política independente de seu pai.
Deposição pelo Egito
O reinado de Joacaz durou apenas três meses. Retornando vitorioso de suas campanhas no norte, o faraó Neco II deteve-se em Ribla (na Síria) e convocou o novo rei de Judá. Lá, Joacaz foi deposto e acorrentado. O relato bíblico indica que ele foi posteriormente deportado para o Egito, onde morreu em cativeiro.
Neco II impôs a Judá um pesado tributo de cem talentos de prata e um talento de ouro, demonstrando claramente que o país havia perdido sua independência e se tornara um vassalo egípcio. Como novo governante, o faraó nomeou Eliaquim, irmão mais velho de Joacaz, mudando seu nome para Jeoiaquim.
Jeoiaquim (609-598 a.C.): Vassalo entre Duas Potências
Um Rei Imposto pelo Egito
Jeoiaquim (antes chamado Eliaquim) não foi escolhido pelo povo, mas imposto pelo faraó Neco II. Este início já comprometia sua legitimidade aos olhos de muitos em Judá. De acordo com as fontes bíblicas, especialmente os escritos dos profetas Jeremias e Ezequiel, Jeoiaquim abandonou as reformas religiosas de seu pai, permitindo o ressurgimento de práticas consideradas idólatras.
Política Interna: Opressão e Luxo
Os textos proféticos retratam Jeoiaquim como um governante opressivo e autocentrado. Jeremias critica duramente o rei por utilizar trabalho forçado para construir um palácio luxuoso enquanto o povo sofria sob pesados tributos:
“Ai daquele que constrói a sua casa com injustiça e seus aposentos superiores sem direito, que se serve de seu próximo gratuitamente e não lhe paga pelo seu trabalho” (Jeremias 22:13)
Arqueologicamente, foram encontrados vestígios de construções opulentas em Jerusalém datadas deste período, possivelmente relacionadas aos projetos de construção mencionados nos textos bíblicos.
Vassalagem Babilônica e Rebelião
Em 605 a.C., a situação geopolítica mudou dramaticamente com a vitória babilônica sobre os egípcios na Batalha de Carquemis. Nabucodonosor II, agora rei da Babilônia após a morte de seu pai, perseguiu os egípcios em retirada até a fronteira com o Egito.
Durante esta campanha, Nabucodonosor conquistou Judá e forçou Jeoiaquim a tornar-se seu vassalo. De acordo com o Livro de Daniel, nesta ocasião o rei babilônico levou para a Babilônia os primeiros cativos judeus, incluindo membros da família real e da nobreza, bem como parte dos tesouros do Templo.
Jeoiaquim permaneceu fiel a Nabucodonosor por três anos. Contudo, em 601 a.C., após uma tentativa fracassada dos babilônios de invadir o Egito, o rei judeu julgou que era seguro rebelar-se:
“Jeoiaquim tornou-se seu vassalo por três anos, mas depois voltou atrás e rebelou-se contra ele” (2 Reis 24:1)
Esta decisão revelou-se desastrosa. Nabucodonosor enviou contra Judá tropas babilônicas reforçadas por contingentes de vassalos locais (arameus, moabitas e amonitas). Estas forças devastaram o território judaico.
Morte Controversa
As circunstâncias exatas da morte de Jeoiaquim são obscuras. O relato bíblico é lacônico, apenas mencionando que “Jeoiaquim descansou com seus antepassados” (2 Reis 24:6). No entanto, o profeta Jeremias havia anunciado um fim ignominioso para o rei:
“Terá a sepultura de um jumento, arrastado e jogado fora, além das portas de Jerusalém” (Jeremias 22:19)
Alguns estudiosos sugerem que Jeoiaquim pode ter sido morto durante o cerco de Jerusalém ou assassinado em uma conspiração interna para apaziguar os babilônios. O historiador judeu Josefo, escrevendo no século I d.C., afirma que Nabucodonosor matou o rei e ordenou que seu corpo fosse lançado fora das muralhas da cidade.
Joaquim/Jeconias (598-597 a.C.): O Rei de Três Meses
Um Reino em Colapso
Joaquim (também chamado Jeconias ou Conias) sucedeu a seu pai em circunstâncias extremamente difíceis. Com apenas 18 anos, assumiu o trono de um reino devastado pela guerra e cercado por tropas babilônicas.
O Primeiro Cerco de Jerusalém
Logo após a ascensão de Joaquim, Nabucodonosor pessoalmente liderou suas tropas contra Jerusalém. A cidade foi cercada e, após breve resistência, o jovem rei tomou a decisão de render-se:
“Joaquim, rei de Judá, sua mãe, seus oficiais, seus líderes e seus funcionários – todos se renderam aos babilônios” (2 Reis 24:12)
Esta rendição evitou a destruição da cidade, mas resultou na primeira deportação em massa para a Babilônia.
Deportação e Cativeiro
Em março de 597 a.C., após reinar apenas três meses, Joaquim, sua família e milhares de judeus foram levados cativos para a Babilônia. Os babilônios selecionaram para o exílio principalmente a elite administrativa, militar e artesanal:
“Nabucodonosor levou para o exílio toda Jerusalém: todos os oficiais e guerreiros, e todos os artesãos e ferreiros, num total de dez mil pessoas. Somente os mais pobres da terra foram deixados para trás” (2 Reis 24:14)
O Templo e o palácio real foram parcialmente saqueados, com muitos dos tesouros e objetos sagrados transportados para a Babilônia.
Ao contrário de seu pai e seu tio, Joaquim sobreviveu ao cativeiro. De acordo com os últimos versos do Segundo Livro dos Reis, após 37 anos de prisão, o rei Evil-Merodaque (sucessor de Nabucodonosor) libertou Joaquim e lhe concedeu uma posição privilegiada na corte babilônica.
Zedequias (597-586 a.C.): O Último Rei de Judá
Um Rei Fantoche
Após deportar Joaquim, Nabucodonosor nomeou como novo rei Matanias, tio do rei deposto e filho mais novo de Josias. Seu nome foi mudado para Zedequias (“Yahweh é minha justiça”), possivelmente para simbolizar um novo começo nas relações entre Judá e a Babilônia.
Zedequias prestou solene juramento de fidelidade a Nabucodonosor:
“Nabucodonosor também o fez jurar por Deus, mas Zedequias rebelou-se contra ele, tornando-se obstinado” (2 Crônicas 36:13)
Este juramento era significativo não apenas politicamente, mas também religiosamente, pois invocava o nome de Yahweh como testemunha e garantidor da fidelidade prometida.
Um Reino Dividido
O reinado de Zedequias foi marcado por profundas divisões internas. Uma facção pró-babilônica, possivelmente liderada por membros das famílias que permaneceram em Jerusalém após a deportação de 597 a.C., defendia a submissão a Nabucodonosor. Outra facção, pró-egípcia, pressionava por uma aliança com o Egito para resistir ao domínio babilônico.
O profeta Jeremias representa a primeira posição, aconselhando repetidamente a aceitação do domínio babilônico como parte do plano divino. Outros profetas, como Hananias, defendiam a resistência e prometiam uma rápida libertação do jugo estrangeiro.
O Faraó Hofra e a Tentação Egípcia
Em 589 a.C., a ascensão do faraó Hofra (Apriés) ao trono egípcio deu novo alento à facção pró-egípcia em Jerusalém. Hofra adotou uma política externa agressiva, visando recuperar a influência egípcia na Palestina. Zedequias, pressionado pelos nacionalistas e talvez encorajado por promessas de auxílio egípcio, tomou a fatídica decisão de rebelar-se:
“Zedequias rebelou-se contra o rei da Babilônia, enviando embaixadores ao Egito para conseguir cavalos e um grande exército” (Ezequiel 17:15)
O Cerco Final de Jerusalém
A resposta babilônica foi rápida e devastadora. Em janeiro de 588 a.C., Nabucodonosor iniciou o segundo e definitivo cerco de Jerusalém. A cidade estava relativamente bem fortificada e conseguiu resistir por um período surpreendentemente longo. Durante o cerco, o exército egípcio fez uma breve aparição, forçando os babilônios a suspenderem temporariamente as operações:
“O exército do faraó havia saído do Egito, e quando os babilônios que sitiavam Jerusalém souberam disso, retiraram-se” (Jeremias 37:5)
No entanto, as forças egípcias recuaram sem oferecer batalha, deixando Jerusalém à sua própria sorte. O cerco foi retomado e as condições dentro da cidade deterioraram-se rapidamente. Jeremias descreve cenas de fome extrema, com relatórios de canibalismo entre os habitantes desesperados.
A Queda de Jerusalém e Destino de Zedequias
Em julho de 586 a.C., após 18 meses de cerco, os babilônios finalmente conseguiram abrir uma brecha nas muralhas de Jerusalém. Zedequias e sua guarda tentaram escapar durante a noite, fugindo em direção ao vale do Jordão:
“Toda a guarda fugiu da cidade durante a noite pela porta entre os dois muros perto do jardim do rei, embora os babilônios estivessem ao redor da cidade. Eles fugiram na direção da Arabá” (2 Reis 25:4)
A fuga foi mal-sucedida. O grupo real foi capturado nas planícies de Jericó e levado a Ribla, onde Nabucodonosor havia estabelecido seu quartel-general. O castigo imposto a Zedequias foi particularmente cruel:
“Mataram os filhos de Zedequias na sua frente. Em seguida, furaram-lhe os olhos, prenderam-no com correntes de bronze e o levaram para a Babilônia” (2 Reis 25:7)
Esta punição exemplar tinha forte valor simbólico: a última visão de Zedequias foi a execução de sua descendência, extinguindo efetivamente a linhagem real. Cego e acorrentado, o último rei de Judá foi levado para a Babilônia, onde morreu na prisão.
A Destruição de Jerusalém
Destruição Sistemática e Saques
Um mês após a captura de Zedequias, Nabuzaradã, comandante da guarda real babilônica, chegou a Jerusalém com ordens específicas. Sua missão era destruir completamente as instituições que simbolizavam a identidade nacional e religiosa judaica:
“Ele ateou fogo ao templo do Senhor, ao palácio real e a todas as casas de Jerusalém. Incendiou todos os prédios importantes” (2 Reis 25:9)
O Templo, construído por Salomão aproximadamente 400 anos antes, foi completamente arrasado. Seus tesouros remanescentes foram saqueados e levados para a Babilônia:
“Os babilônios quebraram as colunas de bronze, os estrados e o tanque de bronze, conhecido como ‘Mar’, que estavam no templo do Senhor, e levaram o bronze para a Babilônia” (2 Reis 25:13)
As muralhas da cidade foram demolidas, tornando-a indefensável. Os palácios e residências nobres foram incendiados. Escavações arqueológicas na Cidade de Davi confirmam uma camada de destruição massiva datada deste período, com evidências de incêndio intenso.
Segunda Deportação em Massa
A destruição física da cidade foi acompanhada pela deportação de grande parte da população remanescente:
“Então Nabuzaradã, o comandante da guarda, levou para o exílio o restante do povo que ficara na cidade, os que se renderam a ele e os artesãos que restavam” (2 Reis 25:11)
Esta segunda deportação, combinada com a anterior de 597 a.C., privou Judá de praticamente toda sua elite dirigente, religiosa e artesanal. Apenas os camponeses mais pobres foram deixados para trás para trabalhar nas vinhas e nos campos.
Estima-se que entre 15.000 e 20.000 pessoas foram deportadas para a Babilônia nas várias levas. Embora este número represente apenas uma fração da população total de Judá (estimada entre 60.000 e 80.000), constituía a maior parte da elite urbana de Jerusalém.
O Governo de Gedalias e o Êxodo para o Egito
Para administrar o território devastado, os babilônios nomearam Gedalias, um judeu de família nobre que aparentemente havia adotado uma posição pró-babilônica durante o conflito. Gedalias estabeleceu seu governo em Mispa, uma cidade a poucos quilômetros ao norte de Jerusalém.
Seu mandato foi breve. Após apenas dois meses, Gedalias foi assassinado por Ismael, membro da família real judaica, possivelmente atuando a mando do rei amonita. Este assassinato desencadeou uma nova onda de represálias babilônicas.
Temendo estas represálias, muitos dos judeus remanescentes, incluindo Jeremias, fugiram para o Egito. Este êxodo voluntário para o Egito, combinado com as deportações para a Babilônia, deixou o território de Judá severamente despovoado.
Impacto e Legado
Transformação Religiosa
A destruição do Templo e o exílio provocaram uma profunda crise teológica. Se Yahweh era o Deus de Israel, como poderia permitir a destruição de Sua própria morada e o cativeiro de Seu povo? A resposta a esta crise resultou em transformações fundamentais na religião judaica:
- Desmaterialização do culto: Com o Templo destruído, formas de adoração não sacrificiais, como a oração e o estudo da Lei, ganharam preeminência.
- Universalização da concepção de Deus: Yahweh passou a ser cada vez mais compreendido não apenas como o Deus nacional de Israel, mas como o Senhor de toda a história humana, que poderia usar até mesmo potências estrangeiras como instrumento de Seus propósitos.
- Desenvolvimento sinagogal: As primeiras formas de organização comunitária que posteriormente evoluiriam para o sistema sinagogal surgiram durante o exílio.
- Canonização das escrituras: A compilação e edição de textos sagrados acelerou-se, à medida que os exilados buscavam preservar sua herança cultural e religiosa.
Consequências Políticas e Culturais
O fim do reino de Judá e o exílio babilônico marcaram uma transformação fundamental na identidade judaica:
- Transição de nação para comunidade religiosa: Sem um Estado independente, a identidade judaica redefiniu-se prioritariamente em termos religiosos e culturais, mais do que políticos.
- Diáspora como condição permanente: Mesmo após o retorno de alguns exilados sob o Império Persa, uma grande parte do povo judeu permaneceu dispersa, estabelecendo comunidades vibrantes na Mesopotâmia, Egito e, posteriormente, em todo o Mediterrâneo.
- Desenvolvimento literário: Paradoxalmente, o período do exílio e pós-exílio foi extremamente fértil em termos de produção religiosa e literária. Muitos dos textos que comporiam posteriormente a Bíblia Hebraica foram compilados, editados ou escritos neste período.
- Nova relação com potências estrangeiras: A experiência do exílio ensinou aos judeus a sobreviver culturalmente sob domínio estrangeiro, desenvolvendo estratégias de adaptação e preservação identitária que seriam cruciais em sua história posterior.
Conclusão
A destruição de Jerusalém em 586 a.C. representa muito mais que um evento militar ou político da antiguidade. Foi um momento de ruptura e transformação que definiu o futuro da religião e cultura judaicas. O período que se estende do reinado de Josias ao cativeiro babilônico apresenta notáveis paralelos com outros momentos críticos da história judaica, incluindo a destruição do Segundo Templo pelos romanos em 70 d.C.
Os últimos reis de Judá, de Josias a Zedequias, enfrentaram o desafio de governar um pequeno reino encurralado entre grandes potências. Suas decisões, acertadas ou equivocadas, foram tomadas em um contexto de extrema pressão geopolítica e profunda crise interna. O trágico fim de Jerusalém não pode ser atribuído apenas a erros individuais, mas deve ser compreendido à luz das transformações estruturais que varriam o Oriente Médio nos séculos VII e VI a.C.
O legado deste período traumático foi a emergência de uma nova forma de judaísmo, mais flexível e resiliente, capaz de sobreviver sem as instituições tradicionais de Estado e Templo. Esta capacidade de adaptação e renovação ante a catástrofe constitui, talvez, o mais importante ensinamento que a queda de Jerusalém oferece à posteridade.
FAQ: Perguntas Frequentes sobre a Destruição de Jerusalém pelos Babilônios
1. Por que Nabucodonosor destruiu Jerusalém?
A destruição de Jerusalém em 586 a.C. foi a resposta de Nabucodonosor à repetidas rebeliões do reino de Judá contra o domínio babilônico. Após a deposição e exílio do rei Joaquim em 597 a.C., Nabucodonosor havia instalado Zedequias como rei vassalo. Quando este também se rebelou, confiando em promessas de ajuda egípcia, o monarca babilônico decidiu eliminar definitivamente a ameaça, destruindo as instituições nacionais judaicas e deportando grande parte da população.
2. Quais foram as principais consequências do Exílio Babilônico para a religião judaica?
O Exílio Babilônico transformou profundamente o judaísmo. Com o Templo destruído, surgiram formas alternativas de culto, como a oração comunitária e o estudo da Torá, que seriam a base do posterior sistema sinagogal. A teologia judaica também evoluiu, com uma compreensão mais universal de Deus e uma reinterpretação da história nacional à luz das profecias. O período foi marcado por intensa atividade literária e editorial, com a compilação e redação de muitos textos que mais tarde fariam parte da Bíblia Hebraica.
3. Quanto tempo durou o cerco de Jerusalém pelos babilônios?
O cerco final de Jerusalém durou aproximadamente 18 meses, de janeiro de 588 a.C. a julho de 586 a.C. Foi interrompido brevemente quando os babilônios tiveram que confrontar um exército egípcio que avançava para auxiliar Jerusalém, mas foi retomado após a retirada dos egípcios. Durante este longo período, a cidade sofreu com fome severa e doenças, o que eventualmente contribuiu para sua queda.
4. O que aconteceu com o rei Zedequias após a queda de Jerusalém?
Zedequias tentou fugir da cidade sitiada com sua guarda real, mas foi capturado nas planícies de Jericó. Levado à presença de Nabucodonosor em Ribla (na Síria), ele sofreu um castigo exemplar: seus filhos foram executados diante dele, seus olhos foram arrancados, e ele foi acorrentado e levado para a Babilônia. De acordo com as tradições judaicas, Zedequias morreu na prisão na Babilônia.
5. Todos os judeus foram levados para o exílio na Babilônia?
Não. As deportações babilônicas, ocorridas em várias etapas (605, 597 e 586 a.C.), afetaram principalmente a elite urbana de Jerusalém: a família real, nobres, sacerdotes, artesãos qualificados e escribas. Estima-se que entre 15.000 e 20.000 pessoas foram deportadas, de uma população total de Judá estimada entre 60.000 e 80.000. Os camponeses mais pobres foram deixados para trás para trabalhar a terra. Adicionalmente, muitos judeus fugiram para o Egito após o assassinato de Gedalias, o governador instalado pelos babilônios.
6. Quando e como os judeus retornaram do exílio babilônico?
O retorno do exílio começou em 538 a.C., após Ciro, o Grande, da Pérsia, conquistar a Babilônia. Ciro emitiu um decreto permitindo que os judeus retornassem a sua terra e reconstruíssem o Templo de Jerusalém. O retorno ocorreu em várias ondas ao longo de décadas. A primeira leva de retornados, liderada por Zorobabel, chegou por volta de 537 a.C. A reconstrução do Templo foi concluída em 516 a.C., exatamente 70 anos após sua destruição. Contudo, muitos judeus optaram por permanecer na Babilônia, onde suas comunidades floresceram por muitos séculos, contribuindo para o desenvolvimento da diáspora judaica.
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